Você costuma estabelecer metas muito elevadas para você mesmo? Como você lida com o seu desempenho em relação às metas traçadas? Entende que vale a pena tentar mesmo que não possua as habilidades já desenvolvidas para uma determinada tarefa? Comemora quando consegue atingir suas metas? Sente-se frustrado, culpado ou incompetente quando não atinge altos resultados?
Essas perguntas são uma provocação para falarmos sobre perfeccionismo e ajudá-lo a pensar em como essa característica se apresenta para você.
Na minha experiência na área de gestão de pessoas (que exerci por mais de 15 anos) era comum ouvir as pessoas se auto qualificarem, especialmente em entrevistas, como sendo perfeccionistas. Mas será que as pessoas consideram que essa é uma característica funcional em suas vidas ou prejudicial em algum aspecto?
Para respondermos essa pergunta, precisamos entender o que, afinal, é perfeccionismo.
O perfeccionismo é um traço de personalidade que envolve ter altos padrões de exigência consigo mesmo em uma ou mais áreas da vida. Alguns autores consideram além deste aspecto, a presença de julgamento quanto ao próprio valor pautado pela sua realização e performance.
Há uma corrente de pesquisadores que descreve o perfeccionismo como algo disfuncional, entendendo que uma pessoa perfeccionista importa-se muito em ser perfeita em tudo, ter expectativas irrealistas sobre o quão bem deve se sair nas coisas e ser bastante dura ao se julgar. Ou seja essa combinação pode levar a uma considerável possibilidade de insucesso, vergonha e frustração.
Há outro viés para entender esse traço de personalidade, pela perspectiva de que pode ser adaptativo estabelecer altos padrões de desempenho, compreendendo como um desafio realista, viável, gerar oportunidade de aprimoramento e a satisfação geral com as próprias conquistas.
Você que chegou até aqui deve estar se perguntando neste momento: Mas então perfeccionismo é bom ou ruim?
A resposta é depende!
Se você mantém altos padrões de desempenho, mas ainda trabalha com metas reais, as encara como desafio para o seu crescimento e desenvolvimento, mas diante da possibilidade de não atingimento das mesmas, em sua totalidade, consegue lidar bem. Ou seja, aprende com a experiência e se dá uma nova chance de ter bons resultados e não se define enquanto pessoa pelo insucesso nesta situação, pode-se dizer que sim, pode ser bom!
Cabe fazer um apontamento que neste caso, o estabelecimento de metas reais, leva em consideração se as habilidades da pessoa estão compatíveis com os desafios e se há recursos suficientes (financeiros, energia, tempo) para a execução.
Por outro lado, pode ser muito ruim e prejudicial, se você estabelece metas irrealistas e não aceita lidar com a possibilidade de não atingi-las. Neste caso você se coloca em uma situação de grande pressão e estresse que, inclusive, pode comprometer o seu desempenho. A busca incansável por metas extremamente elevadas, combinada com a sua autoavaliação definida pela sua capacidade de performar e manter esse padrão mesmo que custem sofrimento e prejuízos em várias áreas de sua vida tende a tornar-se problemático.
Note que perfeccionismo pelo ponto de vista mais problemático muitas vezes também está associado com a crença de que você precisa ser perfeito para ser aceito pelos outros e se não for, será julgado negativamente. O foco não está em si mesmo, em busca de aprimoramento, mas em não ficar vulnerável ao julgamento dos outros. Neste caso, o perfeccionismo pode apresentar-se como uma estratégia para compensar uma frágil percepção de autovalor, ficando pendente da aprovação dos outros.
Para colocar um pouco mais de “tempero” nesta conversa, vale lembrar que uma pessoa que possui padrões elevados de exigência consigo, pode também ter expectativas elevadas em relação aos outros e ser excessivamente crítico quando elas não atendem tais expectativas. Como consequência deste comportamento podem ocorrer problemas nos relacionamentos com os outros. Pense que essa pessoa exigente poderia ser o seu gestor, seus pais ou o seu marido/ esposa por exemplo.
Como você já deve ter percebido, o perfeccionismo, quando em excesso, pode ser um aspecto que aumenta a vulnerabilidade para o desenvolvimento de transtornos como ansiedade, depressão, transtornos alimentares, burnout e, em casos extremos, pensamentos de querer acabar com a vida por sentir-se uma pessoa com pouco valor.
O que leva uma pessoa ao perfeccionismo?
Uma das possíveis formas de entender esse traço de personalidade é com base no aprendizado a partir das experiências vividas desde a infância, o quanto essa criança teve as suas necessidades emocionais supridas, combinadas ao seu temperamento.
Ao conhecer a história de vida de pessoas perfeccionistas, alguns aspectos costumam ser mencionados em seus relatos:
- Educação pautada em expectativas extremamente elevadas ou padrões rígidos estabelecidos pelos pais. Neste caso, a criança é recompensada apenas por realizações excepcionais, então “aprende” que o seu valor está vinculado ao desempenho perfeito.
- Crianças que lidam com críticas frequentes e pouca tolerância ao erro podem internalizar a ideia de que só são dignas de amor e aceitação quando atingem padrões elevados. Isso pode levar a uma busca constante pela perfeição para evitar críticas e rejeição.
- Pessoas perfeccionistas como modelo de comportamento, sejam pais e/ ou outras pessoas importantes. Sabe-se que esse é um importante aspecto de aprendizagem.
- Experiência com restrição de afeto, amor, reconhecimento ou validação emocional, ela pode desenvolver autoexigência e acreditar que a perfeição é a única maneira de ser digna de amor.
- Crescer em ambientes competitivos, seja em casa, escola ou outros nos quais a criança socializa.
Talvez você já tenha visto uma criança que chora ou reage muito mal ao receber uma nota 9,5; ou quem sabe alguém sentir-se incompetente porque “apenas” atingiu as metas propostas pela empresa, enquanto esperava superá-las.
Talvez você tenha escutado seus pais dizerem que você não fez nada mais que a sua obrigação em tirar uma boa nota, afinal você só estuda! Ou ainda quando tirou uma nota 9, que deveria ter tirado 10.
Acho que sou perfeccionista: o que fazer?
Se você se identificou com esse comportamento, reflita como ele aparece na sua vida: ele é confortável, impulsiona você a ter bons resultados? Ele aprisiona, deixa você exausto e muitas vezes frustrado e privado de outras coisas que são importantes para você?
Se a sua resposta está mais direcionada para a segunda opção, ou seja, gera desconforto na maior parte do tempo, talvez seja o momento de você buscar formas mais saudáveis de lidar com o perfeccionismo.
Identificar as suas crenças e regras internas podem ajudá-lo a buscar estratégias mais funcionais e satisfatórias no seu enfrentamento de situações da vida. Um profissional de saúde mental pode ajudar você nesta jornada.